sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Mais cultura, mais livros

Em 2007, foi lançado o Programa Mais Cultura, com uma previsão de
investimentos de R$ 4,7 bilhões até 2010. O orçamento do MinC para o
Programa Mais Cultura em 2008 atingiu R$ 226 milhões. Dentro deste
programa, foi criado o Concurso Pontos de Leitura 2008 - Edição
Machado de Assis, que teve mais de 700 inscritos. Já o Projeto Leitura
para Todos anunciou, em setembro, a implantação de 122 salas de
leitura, sendo que cada unidade é composta por um acervo de mil livros
- 500 títulos com dois exemplares cada, um para empréstimo e outro
para leitura no local. Também vale lembrar do Fórum Literatura na
Escola - Biblioteca Escolar e Mediação da Leitura, promovido pelos
ministérios da Educação e da Cultura, que aconteceu em Brasília nos
dias 24 e 25 de julho, quando foi feita uma série de sugestões para o
fomento à leitura e à difusão da literatura brasileira.

Intercâmbio de experiências e idéias


Em 2008, houve a intensificação da troca de experiências
nacionais e internacionais entre profissionais e demais interessados
na promoção e incentivo à leitura. Este foi um dos objetivos, por
exemplo, do II Fórum do Plano Nacional do Livro e Leitura (clique aqui
para ler o relatório final) que, em agosto, debateu a valorização das
bibliotecas e disseminação da informação. Na ocasião, foram
apresentadas e discutidas as experiências de promoção e incentivo à
leitura nas diversas regiões do Brasil, assim como projetos da França,
Chile e Colômbia. Concomitantemente, no I Seminário Internacional de
Bibliotecas Públicas e Comunitárias, foram apresentadas experiências
nacionais e internacionais bem sucedidas na área de promoção, mediação
e incentivo à leitura, incluindo projetos de acessibilidade para
pessoas com baixa visão e cegas. E a mesma ênfase no diálogo foi vista
no III Seminário dos Planos Nacionais do Livro e Leitura no Mercosul,
que aconteceu em novembro, quando se discutiu políticas de
desenvolvimento da prática da leitura e o processo de constituição e
consolidação dos planos nacionais de livro e leitura no Mercosul e
demais países da América Latina.

Instituto Nacional do Livro

A recriação do Instituto Nacional do Livro (INL) foi um
dos temas mais debatidos este ano por editores, escritores e
livreiros. Em agosto, durante a 20ª Bienal Internacional do Livro de
São Paulo, o ministro da Cultura Juca Ferreira recebeu um documento
pedindo a volta do INL. Em outubro, este foi um dos temas discutidos
no I Seminário de Políticas de Incentivo à Leitura no Brasil. O
Governo Federal negocia a criação do Instituto do Livro e Leitura no
Brasil, que deverá centralizar a gestão política, hoje a cargo da
Fundação Biblioteca Nacional, e administrará o orçamento do MinC para
esse setor. A contribuição estimada do mercado é de R$ 60 milhões por
ano e a do governo, R$ 40 milhões. Para o secretário executivo do
PNLL, José Castilho Marques Neto, "com o instituto, haverá maior poder
de pressão e aglutinação de verbas. É uma forma de reforçar a
musculatura para as políticas do livro".

Fundo Pró-Leitura

O Fundo Pró-Leitura é a contrapartida do setor livreiro -
com 1% de seu faturamento anual ? à desoneração de PIS e Cofins sobre
o livro. A previsão é que gere cerca de R$ 46 milhões por ano para
ações que democratizem o acesso ao livro e transformem a qualidade da
capacidade leitora no Brasil. Mas ainda há discussões sobre essa
contribuição. No dia 29 de outubro, o ministro da Cultura, Juca
Ferreira, afirmou que o Fundo Pró-Leitura - forma de financiamento das
ações previstas no Plano Nacional do Livro e Leitura (PNLL) - poderá
ser criado por decreto presidencial. Caso a proposta de criação do
fundo precise passar pelo Congresso, o ministro acredita que terá
apoio de deputados e senadores para sua aprovação.

Retratos da Leitura no Brasil

Elaborada pelo Instituto Pró-Livro, a pesquisa Retratos da
Leitura no Brasil teve seus resultados divulgados em maio. O estudo
indica que o Brasil tem hoje cerca de 95 milhões de leitores - número
deduzido a partir da porcentagem de pessoas que declararam ter lido
pelo menos um livro nos últimos três meses. Foram entrevistadas mais
de cinco mil pessoas em 311 municípios brasileiros. Entre outros
dados, a pesquisa mostra que os brasileiros estão lendo mais, que há
mais mulheres leitoras do que homens e que apenas um décimo da
população tem o hábito de freqüentar bibliotecas. A Bíblia é o livro
mais conhecido pelos brasileiros - 43 milhões de pessoas afirmam já a
terem lido. Na lista dos autores mais populares no país, Monteiro
Lobato, Paulo Coelho, Jorge Amado e Machado de Assis. Em média, o
brasileiro lê 4,7 livros a cada ano.

Seminário de Políticas de Incentivo à Leitura no Brasil

Em outubro, autoridades e especialistas se reuniram em
Brasília para debater políticas públicas na área do livro e da
leitura. O ministro da Cultura, Juca Ferreira, considerou o Instituto
Nacional do Livro (INL) essencial para que haja "uma estrutura mínima
que dê capacidade à articulação do conhecimento, das técnicas
necessárias ao seu desenvolvimento". O Seminário também tratou de
outros assuntos fundamentais para o desenvolvimento do Brasil como
sociedade leitora. Dentre esses temas, segundo Jéferson Assumção,
então coordenador geral do livro e leitura do MinC, estão "o
financiamento, através da criação do Fundo Pró-Leitura e a recuperação
da institucionalidade do livro, com o Instituto Nacional do Livro e
Leitura". Já os avanços e obstáculos do PNLL foram discutidos por José
Castilho Marques Neto, secretário executivo do Plano Nacional do Livro
e Leitura, na primeira mesa de debates. Também estiveram presentes no
evento o senador Cristovão Buarque, que defendeu o projeto da criação
do Dia da Leitura no dia das crianças (12 de outubro) e o deputado
Geraldo Magela (PT-DF), que debateu na Mesa II a criação de uma
entidade autônoma para o livro.

Acordo ortográfico

O Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa propõe uma
ortografia única a ser usada por todos os países de língua portuguesa.
Foi assinado em 1991, mas apenas este ano foi ratificado por todos os
governos. O Acordo possibilita a criação de normas ortográficas comuns
para as variantes da língua portuguesa, facilita a difusão
bibliográfica e de novas tecnologias, reduz o custo econômico e
financeiro da produção de livros e documentos. Em outubro, o
Ministério da Educação anunciou que irá comprar e distribuir, em 2009,
dicionários já atualizados com as novas regras.

Ano Nacional Machado de Assis

Para marcar o centenário da morte daquele que talvez seja
o maior expoente das letras brasileiras, 2008 foi declarado o Ano
Nacional Machado de Assis. Seminários, conferências, exposições e
lançamentos foram dedicados ao autor de Memórias Póstumas de Brás
Cubas, Dom Casmurro, Memorial de Aires e outros romances, além de
contos, poesias, artigos, crônicas e peças de teatro. Um ano também em
que se celebrou o nascimento de dois outros gigantes da literatura: o
Padre Vieira, 400 anos, e Guimarães Rosa, 100 anos.

O futuro do livro e da leitura

Desde que começou a rápida difusão das mídias digitais em
meados dos anos 90, freqüentemente se coloca a questão da
sobrevivência do livro impresso - e também das editoras. A edição 02
do Libro al Dia, publicado em abril pelo Cerlalc (Centro Regional para
o Fomento ao Livro na América Latina e Caribe), é dedicada a pensar as
oportunidades abertas com o mundo digital, questionando sobre como
essas tecnologias afetam o sistema de produção e o acesso ao livro e
quais são os benefícios da Internet. Em maio, Robert McCrum, editor de
livros do The Observer, escreveu seu último texto para o jornal
britânico. Tratava-se justamente de uma reflexão sobre as
transformações presenciadas por ele nos últimos 10 anos, quando um
mundo de "papel, tinta, café e cigarros" foi revolucionado por novos
escritores, muito dinheiro, a internet, prêmios lucrativos e festivais
literários. E as inovações não param, como mostra o sucesso em 2008
dos "telefones inteligentes". Já há serviços de compra e leitura de
livros por esta nova mídia, que trazem algumas adaptações, como
"lembretes automáticos dos livros que pararam de ler, particularmente
quando mudarem de músicas ou estiverem atendendo o celular".
Paralelamente, em 2008 também se debateu o fortalecimento das
habilidades empresariais dos livreiros latino-americanos, como
aconteceu no Seminário Internacional para Editores e Livreiros "A
livraria e seus clientes", promovido pelo Cerlalc em outubro, no
México. Outro seminário da mesma instituição discutiu, em setembro,
indicadores culturais latino-americanos.

Alguns eventos de 2008

III Seminário dos Planos Nacionais do Livro e Leitura no Mercosul
Durante os dias 26 e 27 de novembro, foi realizado em São
Paulo, no Museu da Língua Portuguesa, ocasião em que foram
apresentados o estágio de desenvolvimento do plano do livro e leitura
em cada país do Mercosul e discutidas várias medidas e propostas de
ações em comum.

II Fórum do Plano Nacional do Livro e Leitura
Em agosto, reuniu em São Paulo cerca de 500 profissionais
e interessados na promoção e incentivo à leitura, na valorização das
bibliotecas e na disseminação da informação. Além de uma retrospectiva
de dois anos do PNLL, analisando avanços e dificuldades encontradas,
foram apresentadas e discutidas as experiências de promoção e
incentivo à leitura nas diversas regiões do Brasil, assim como
projetos da França, Chile e Colômbia. Saiba mais.

PNLL: Bibliotecas e Mediadores pela Leitura no Brasil
Durante a Bienal do Livro de Minas Gerais, em maio,
diversas mesas-redondas discutiram o PNLL, o Prêmio VivaLeitura e o
Proler.

Congresso Moçambique-Brasil
O tema Digitalização, democracia e diversidade foi o
objeto principal de discussão na primeira edição deste evento na
cidade de Maputo, em Moçambique, entre os dias 9 e 12 de junho, que
contou com a participação de professores brasileiros e moçambicanos,
além de exposições e debates. Saiba mais.

20ª Bienal do Livro de São Paulo
Em agosto, o PNLL fez sua estréia na Bienal Internacional
do Livro de São Paulo. Em um espaço de 150 metros quadrados, divulgou
os projetos cadastrados em seu Mapa de Ações e as iniciativas dos
Ministérios da Cultura e da Educação relacionadas ao livro e à
leitura.

Olimpíada de Língua Portuguesa Escrevendo o Futuro
O projeto tem como objetivo levar para a sala de aula
novas metodologias de ensino que estimulem a leitura e a escrita nas
escolas públicas. Os vencedores foram anunciados em dezembro. Saiba
mais.

Fórum Literatura na Escola
Promovido pelo MEC e MinC em julho, apresentou uma série
de sugestões para o fomento à leitura e à difusão da literatura
brasileira. Entre elas, a reintrodução do estudo da literatura nas
diretrizes das escolas de educação básica, a manutenção de acervos
bibliográficos, a transformação da biblioteca em um espaço que seja o
"cérebro da escola", a mudança no currículo de formação do
bibliotecário e a formação inicial e continuada do professor. Saiba
mais.

Dicas de leitura

Singularidades de uma Rapariga Loura, de José Maria Eça de Queirós
"Começou por me dizer que o seu caso era simples ? e que
se chamava Macário...
Devo contar que conheci este homem numa estalagem do
Minho. Era alto e grosso: tinha uma calva larga, luzidia e lisa, com
repas brancas que se lhe eriçavam em redor: e os seus olhos pretos,
com a pele em roda engelhada e amarelada, e olheiras papudas, tinham
uma singular clareza e rectidão - por trás dos seus óculos redondos
com aros de tartaruga. Tinha a barba rapada, o queixo saliente e
resoluto. Trazia uma gravata de cetim negro apertada por trás com uma
fivela; um casaco comprido cor de pinhão, com as mangas estreitas e
justas e canhões de veludilho. E pela longa abertura do seu colete de
seda, onde reluzia um grilhão antigo - saíam as pregas moles de uma
camisa bordada.
Era isto em Setembro; já as noites vinham mais cedo com
uma friagem fina e seca e uma escuridão aparatosa. Eu tinha descido da
diligência, fatigado, esfomeado, tiritando num cobrejão de listras
escarlates."
Leia este e outros contos de Eça de Queirós

Canções e Elegias, de Luís Vaz de Camões
"A instabilidade da Fortuna,
os enganos suaves de Amor cego,
(suaves, se duraram longamente),
direi, por dar à vida algum sossego;
que, pois a grave pena me importuna,
importune meu canto a toda a gente.
E se o passado bem co mal presente
me endurece a voz no peito frio,
o grande desvario
dará de minha pena sinal certo,
que um erro em tantos erros é concerto.
E, pois nesta verdade me confio
(se verdade se achar no mal que digo),
caiba o mundo de Amor o desconcerto,
que já co a Razão se fez amigo,
só por não deixar culpa sem castigo.

Já Amor fez leis, sem ter comigo alguma;
já se tornou, de cego, arrazoado,
só por usar comigo sem-razões.
E, se em alguma cousa o tenho errado,
com siso, grande dor não vi nenhuma,
nem ele deu sem erros afeições.
Mas, por usar de suas isenções,
buscou fingidas causas por matar-me;
que, para derrubar-me
no abismo infernal de meu tormento,
não foi soberbo nunca o pensamento,
nem pretende mais alto levantar-me
daquilo que ele quis; e se ele ordena
que eu pague seu ousado atrevimento,
saiba que o mesmo Amor que me condena
me fez cair na culpa e mais na pena."
Leia este poema e outros de Camões na íntegra